Portugal, Bolsonaro e Espelhos
Há uns meses, parti o espelho do meu quarto. Ao fechar a porta do armário com um pouco mais de força, o espelho partiu-se. Entretanto, não comprei outro – falta de tempo, de dinheiro, de vontade… – e, portanto, a minha manhã é um pouco mais complicada por ter de ir usar o espelho da casa de banho para ver se estou apresentável para o dia.
Há umas semanas, por outro lado, o Brasil decidiu eleger Jair Bolsonaro como Presidente, uma decisão que deixou muita gente em Portugal estupefacta. Muitos portugueses acusaram os brasileiros de se terem virado para o fascismo, convidaram brasileiros que votaram no Bolsonaro a voltarem ao Brasil (como fez a presidente da junta de freguesia de Arroios, em Lisboa – onde, por sinal, vive uma enorme comunidade brasileira) e acusaram os portugueses que disseram compreender o voto no Bolsonaro ou que disseram que ambas as opções eram más de também eles serem fascistas.
A questão que eu coloco é: alguma destas pessoas conhece a realidade brasileira? Conhece verdadeiramente? Fora da realidade do Hotel Emiliano ou do Marina Palace? Ninguém percebe porque é que o Brasil, numa escolha entre o Lula 2.0 e o Bolsonaro acabou por escolher o segundo?
Vamos ver a situação do Brasil por um pouco, pode ser?
Antes da eleição, uns meros 95% dos Brasileiros disseram que o país segue na direção errada, segundo uma sondagem da Ipsos. Isto resulta do facto do Brasil estar apenas agora a sair da pior recessão da sua história enquanto verifica altas taxas de desemprego. No Brasil houve, também, 63.880 homicídios em 2017, mais do que os Estados Unidos e a Europa juntos. 30% dos cidadãos do Rio de Janeiro viram-se envolvidos num tiroteio em 2017!
E, claro, não podemos esquecer o elefante na sala: a operação Lava Jato. Já todos sabemos do que é que a casa gasta, no que diz respeito à operação Lava Jato, mas não esqueçamos que o prisioneiro mais célebre em resultado desta operação foi Lula da Silva, que o Fernando Haddad fez questão de tentar emular na primeira volta, e que muitas das mesmas pessoas que andaram a acusar os apoiantes de Bolsonaro ou apenas pessoas que se disseram como neutras de serem fascistas e antidemocráticas, andaram a dizer que ele tinha sido preso injustamente e por motivações políticas – o que, acrescente-se, é um comportamento muito pouco democrático.
Então, há dúvidas das razões que levaram muita gente, em desespero, a votar num candidato que prometia uma melhoria económica, mais segurança nas ruas e o fim da corrupção no Brasil em vez de um tipo que, aos seus olhos, representa tudo o que de mal se passa no Brasil em geral e nas suas vidas em particular? Claro que o Bolsonaro não é uma boa escolha, mas Haddad também não era muito melhor.
A conclusão a que chego depois destas eleições brasileiras é uma: não sou o único que precisa de um espelho novo.
Diogo Monteiro
Estudante do 1.º Ano de Economia na FEP