Opinião: “Paz, Estabilidade, Vucic”

Jorge Costa Braga

Estudante de Direito na Universidade do Porto

“Paz, Estabilidade, Vucic”: foram estas as promessas do vitorioso Partido Progressista Sérvio (PPS) para as eleições presidenciais e legislativas que ocorreram no dia 3 de abril.

Se a paz é um eventual delírio no horizonte a leste, podemo-nos convencer que Vucic, Presidente reeleito da Sérvia pelo PPS, é uma certeza, tendo obtido uma esmagadora vitória de quase 60% dos votos (58.54%). Quanto à estabilidade, essa sim é uma incógnita, uma vez que a coligação “Juntos Podemos Fazer Tudo”, liderada pelo PPS, perdeu a maioria absoluta na Assembleia Nacional, passando de 188 lugares para 120 (em 250).

A coligação liderada pelo Partido Socialista Sérvio (PSS) não só perdeu um lugar no parlamento (ficando com 31 deputados), mas também o lugar de segunda força política. Apesar de o PSS ser o segundo partido com mais lugares (23), a coligação Unidos para a Vitória da Sérvia (UVS) ultrapassou-os obtendo 38 lugares, distribuídos por 12 partidos.

No fundo, as três maiores candidaturas não são propriamente ideológicas, podendo-se classificar como “big-tent”, centristas e pragmáticos, apesar de haver uma certa tendência, estando a candidatura do PPS no centro-direita, a UVS no centrismo liberal e sendo o PSS social-democrata.

É tradição na Sérvia as duas candidaturas do arco da governação (lideradas pelo PPS e PSS) formarem coligação, independentemente do resultado, para que os projetos a longo prazo sejam unânimes e as linhas mestras das políticas nacionais não mudem drasticamente com a mudança de governo. Será provavelmente esse o desfecho, uma vez que os socialistas apoiaram a candidatura presidencial de Vucic, evitando a necessidade de o Presidente ter de ir a uma segunda volta. No entanto, desta vez, os socialistas exigem liderar o governo, aliás, o nome da coligação liderada pelo PSS é Ivica Dačić — primeiro-ministro da Sérvia.

À semelhança de Portugal, o sistema de governo sérvio é semipresidencial, pelo que a chefia de governo cabe ao primeiro-ministro. Tendo a maioria relativa no governo, o PPS poderá abdicar do lugar de primeiro-ministro em função do PSS, mantendo o controlo do governo de facto. A alternativa realista seria um acordo parlamentar que garantisse a maioria na Assembleia Nacional, nomeadamente com a Aliança Voivodina dos Húngaros, um partido regionalista com seis lugares que representa a minoria húngara e está próximo do Fidesz, partido de Viktor Orbán, Primeiro-Ministro da Hungria.

De facto, Vucic é bastante próximo de Órban nas suas tendências iliberais, e na sua imagem de Homem de Estado que se posiciona acima dos conflitos internacionais, em virtude da relativa proximidade de ambos os países em relação à Rússia. Putin congratulou a vitória de ambos os líderes e Vucic, no seu discurso de vitória, afirmou querer manter “a amizade e as relações de parceria” com a Rússia.

Relembremo-nos que a Rússia e a Sérvia são velhos aliados, e foi o apoio da Rússia à Sérvia, perante a declaração de guerra do Império Austro-Húngaro, que desencadeou a Primeira Guerra Mundial, e que a intervenção da NATO na Jugoslávia em 1999, também deixou desconfianças nos sérvios em relação a esta organização militar. Por outro lado, a Sérvia não quer colocar em causa as suas relações com a União Europeia, o seu maior parceiro comercial, que está a fazer pressões para que a Sérvia avance com sanções à Rússia, pelo que Vucic vai fazendo pequenas cedências, como votar na Assembleia Geral da ONU para suspensão da Rússia do Conselho de Direitos Humanos.

O novo parlamento é formado 30 dias após a divulgação dos resultados definitivos da eleição, e depois disso o novo governo tem 90 dias para ser formado. Vucic decerto aproveitar-se-á do tempo para não tomar grandes decisões no plano internacional, alegando incerteza, e contando com a mitigação do conflito.