O IVA zero vai ser aplicado em 46 alimentos essenciais a partir de 18 de abril de 2023 e mantém-se até 31 de outubro deste ano. O cabaz de alimentos inclui carne, peixe, ovos, frutas, legumes, leguminosas, lacticínios, pão, batata, massa, arroz, gorduras e óleos. A isenção do imposto integra o pacote de medidas concebido pelo governo para apoiar as famílias no contexto da elevada inflação vigente.
A lista final de 46 bens alimentares apresenta apenas mais dois alimentos em relação à lista original, que compreendia 44. O PS aprovou a inclusão de “bebidas e iogurtes de base vegetal, sem leite e lacticínios, produzidos à base de frutos secos, cereais ou preparados à base de cereais, frutas, legumes ou produtos hortícolas” e de “produtos dietéticos destinados à nutrição entérica e produtos sem glúten para doentes celíacos”. A inclusão de produtos vegetais foi proposta pelo PAN e pelo BE e os produtos dietéticos e sem glúten partiram do PSD.
A proposta de IVA 0% foi aprovada com votos a favor de PS, Iniciativa Liberal e Chega. O PSD, o PCP, o BE, e os deputados únicos do PAN e Livre abstiveram-se. A medida prevê a redução do IVA de 6% para 0% em 46 alimentos essenciais, com o objetivo de fazer baixar o preço desses produtos.
A redução dos preços vai ser acompanhada por uma comissão constituída por entidades públicas e privadas, para que as entidades reguladoras possam fiscalizar o cumprimento do acordo. O compromisso foi celebrado por António Costa com a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), representada pelo presidente, Eduardo Oliveira e Sousa, e com a Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), representada pelo director-geral, Gonçalo Lobo Xavier.
Segundo o governo, o acordo celebrado com os setores de produção e distribuição para a isenção do IVA com direito à dedução (taxa zero) dos produtos que integram um cabaz alimentar saudável vai ter um custo aproximado de 600 milhões de euros . António Costa relembra que este acordo que foi consumado com o propósito de “garantir que conseguimos, de forma solidária, diminuir os preços da cadeia alimentar“.
O preço de venda final de um bem “não depende apenas do imposto”, resulta também do preço da cadeia de produção. Por isso, além do compromisso com o setor do retalho, a medida vai contemplar apoios à produção. O entendimento, segundo o primeiro-ministro, “é feito na boa-fé entre todos”.
” Em casa onde há inflação, todos ralham e todos têm a sua parte da razão e o pior que podíamos fazer era pôr-nos todos a ralhar”, disse António Costa
Impacto da medida na inflação
Durante a apresentação do Programa de Estabilidade na segunda-feira (17 de abril), o ministro das Finanças, Fernando Medina, afirmou que a aplicação da taxa zero de IVA “terá um impacto positivo na redução” do índice de preços, “de 0,2%”.
Além disso, no mesmo Programa, o governo frisa que a crescente inflação desde 2022 “foi impulsionada pela subida dos preços internacionais dos produtos alimentares e dos fertilizantes, que se intensificou com a invasão russa da Ucrânia, bem como um contexto de seca em diversos países europeus”.
Após uma variação dos preços de 8,1% em 2022, a previsão do governo é de que a inflação será de 5,1% e que em 2024 se fixe em 2,9%. De acordo com os últimos dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), em março a inflação registou o valor de 7,4%, sendo que os preços dos produtos continuam a subir, mas a um ritmo menos acelerado.
Atualmente, Portugal aplica uma isenção de IVA, com direito à dedução, aos fertilizantes, corretivos de solo e rações, que beneficiam de uma medida extraordinária até 31 de dezembro de 2023.
“Os produtores precisam de compensações. Não são culpados pela inflação e pela subida dos preços. Antes pelo contrário, sofrem com ela”, afirmou o presidente da CAP
Os exemplos de Espanha e França com o IVA 0
À semelhança de Portugal, Espanha anunciou uma medida idêntica em dezembro do ano passado, para tentar combater a inflação. No entanto, a medida levada a cabo a partir de 1 de janeiro deste ano não se repercutiu nos preços dos produtos comercializados.
O governo decidiu reduzir de 4% para 0% o IVA de todos os bens alimentares de primeira necessidade (legumes, lacticínios, pão, farinhas, ovos, frutas, cereais e tubérculos) e de 10% para 5% o IVA do azeite e das massas. Em contrapartida, em Portugal, a seleção de produtos foi elaborada com o apoio do Ministério da Saúde, que se baseou, segundo o primeiro-ministro “na roda dos alimentos e nos alimentos mais consumidos pelos portugueses”.
No país vizinho, a aplicação da taxa de IVA zero teve efeitos nulos, visto que os preços praticados pelos retalhistas absorveram a descida do imposto sobre o valor acrescentado. Por este motivo e para evitar correr o mesmo risco, o governo português negociou com o retalho a lista de produtos abrangida pela medida que agora entra em vigor.
O presidente da Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED), Gonçalo Lobo Xavier, garantiu que o setor vai cumprir o acordo com o Governo, mas ressalva que “ninguém consegue garantir a estabilização dos preços”.
Em França, a primeira intenção foi criar um cabaz composto por 50 bens de primeira necessidade, cujos preços iriam permanecer fixados por um período determinado de tempo. Contudo, a ideia inicial gerou protesto por parte dos retalhistas que se opunham à fixação de preços.
Como solução, o governo apresentou uma nova medida, “trimestre anti-inflação”, a qual prevê que sejam as próprias distribuidoras alimentares a definirem um conjunto de produtos, à sua escolha, que serão vendidos ao “menor preço possível”, durante um trimestre. Cada distribuidor tem liberdade para escolher os produtos abrangidos pela medida, o preço dos mesmos e a duração da aplicação dos descontos sobre os bens. Os produtos selecionados são identificados com um autocolante com as palavras “trimestre anti-inflação” e o logótipo de um carrinho de compras, com as cores azul, vermelho e branco.
Já várias cadeias de supermercado se propuseram a aderir à medida, numa altura em que a inflação está também a disparar para os franceses. A medida entrou em vigor no dia 15 de março de 2023, mas, para já, os franceses confessam não notar muitas diferenças depois da aplicação da medida. Tal se justifica pelo facto de os distribuidores poderem aplicar descontos sobre os produtos que entenderem, e não necessariamente sobre os bens essenciais ou mais procurados. Por outro lado, podem não aplicar sequer a medida, tendo em consideração a sua não obrigatoriedade.
Tanto em Espanha como em França, continuam a registar-se subidas acentuadas da inflação após estas medidas.