A República de Taiwan é uma ilha localizada na Ásia Oriental, fundada por meio de oposicionistas ao governo comunista chinês, que se exilaram neste território. No entanto, é historicamente considerada parte integral da República Popular da China.

Apesar de ainda não ser considerado um país, mas sim uma província da China, Taiwan distancia-se das ordens de Pequim e verifica-se, por isso, uma elevada autonomia política e económica local. Além disso, a sua forte e renovada rede de comunicação e infraestruturas, o apoio ao multiculturalismo e às liberdades individuais e de expressão fazem desta nação um dos 4 Tigres Asiáticos, ou seja, uma das 4 potências asiáticas a nível económico e industrial – observando-se um rápido crescimento a partir da segunda metade do século XX (pós 2ª Guerra Mundial).

Taiwan: história, mapa, dados gerais, curiosidades - Brasil EscolaTaiwan. Fonte: Getty Images

O governo taiwanês orienta-se segundo uma república semipresidencialista, onde vigora um regime democrático e os presidentes são eleitos livremente pela população. Taiwan está também divido administrativamente em 8 regiões, sendo elas Hôko, Taichu, Takao, Karenko, Taito, Tainan, Schinchiku e Taihoku.

As eleições locais e os principais partidos em ação

As últimas eleições regionais no Taiwan aconteceram no final do ano passado, a 26 de novembro. Apesar de terem passado despercebidas em quase todo o mundo, estas eleições – nas quais se elegeram os representantes locais – tiveram um elevado impacto no atual espetro político e numa futura relação com a China. Um dos pontos fortes destas eleições locais é o facto de serem vistas como uma espécie de “intermediárias” para a Presidência da República de Taiwan (principalmente o eleito em Taipé, a capital). Contudo, a atual preocupação chinesa, envolvendo Taiwan e os Estados Unidos da América (EUA), fez destas eleições ainda mais importantes, uma vez que a China pretendia aumentar a sua influência na política interna da ilha.

Os dois partidos mais influentes e preponderantes em Taiwan são o Partido Nacionalista Chinês (ou Kuomintang, KMT) e o Partido Democrático Progressista (DPP). Desde a década de 1970 que os nacionalistas eram o partido governante, cenário que se alterou nas eleições gerais de 2016, dando a vitória aos progressistas e à sua presidente, Tsai Ing-wen.

Desta forma, o Partido Progressista Democrata apostou, nestas eleições regionais, numa campanha que valorizou o trabalho feito por Tsai Ing-wen como presidente e, consequentemente, pela forma como o partido lidou com a pandemia (estabilizou o índice de novos casos em valores baixos e apostou numa maior liberdade à população local, face às restrições que estavam a acontecer no resto do mundo). Esta alusão e referência à saúde como uma mais valia deveu-se, em grande parte, ao facto do candidato a presidente de Taipé pelos progressistas, Chen Shih-chung, ter sido ministro da saúde. Além disso, focaram-se na luta pelo progressismo, democracia e afastamento à China continental. Uma das evidências que demonstrava as políticas de distanciamento de Taiwan face ao regime repressivo da China foi o referendo que foi a votos, no próprio dia das eleições, acerca da possibilidade de reduzir a idade de sufrágio dos 20 para os 18 anos, fazendo assim do sufrágio um tema importante.

Taiwan em alerta após a visita de Nancy Pelosi – DW – 03/08/2022Manifestantes a favor da independência de Taiwan. Foto: Ann Wang (Reuters)

Do outro lado da ideologia política, o Partido Nacionalista tinha a missão de voltar ao passado e conquistar o apoio do seu eleitorado que tem vindo a perder ultimamente, cedendo lugares a partidos mais progressistas. Mesmo com a recente quebra, o otimismo no KMT era visível pois apresentava, como sempre o fez, um grande trunfo: a História. Este é o partido que para sempre ficará associado à fundação de Taiwan e as figuras históricas e mais populares taiwanesas têm, também elas, ligação ao partido. Além disso, o candidato a Taipé, capital e cidade “decisiva”, era um nome bem conhecido no partido e em todo o território. Chiang Wan-na, bisneto e neto de ex-lideres do Partido Nacionalista trocou a advocacia pela política, aludindo ao sentido de dever por Taiwan e ao legado que lhe foi deixado.

A demissão da Presidente da República de Taiwan

Decorridas as eleições, verificou-se uma vitória avassaladora dos nacionalistas face ao Partido Progressista Democrata. Assim, o KMT conquistou 13 das 21 autarquias a votação, incluindo a já referenciada capital Taipei. O Partido Democrático Progressista apenas garantiu a vitória em 5. As cidades de Taoyun, Keelung e Nova Taipei, cidades mais progressistas, foram também estas conquistadas pelo partido de Chiang, acentuando assim a desastrosa noite eleitoral para o DPP.

Estes resultados fazem prever uma eleição presidencial mais favorável ao KMT e, em contrapartida, o DDP planeará, até então, uma nova estratégia para combater a emergência dos seus rivais. Contudo, apesar de serem um forte indicador, estas eleições não garantem um resultado positivo nas eleições que se seguirão.

Zhu Fenglian, em declarações à Xinhua, agência de notícias oficial da República Popular da China, referiu que estas eleições espelham a vontade do povo taiwanês pela “paz, estabilidade e boa vida”.

Face aos resultados das eleições a presidente Tsai Ing-wen não viu outra solução senão a sua demissão de líder do partido.

Tsai afirmou que o plano dos progressistas falhou, assegurando que “Ainda há lacunas entre as expectativas das pessoas e o nosso trabalho de base”, acrescentado ainda que “os resultados falharam com as nossas expetativas. Aceitamos humildemente os resultados e aceitamos a decisão do povo taiwanês”.

À parte do sucedido, Tsai Ing-wen continuará em funções como Presidente de Taiwan até novas eleições e recusou também o pedido do seu primeiro-ministro, Su Tseng-chang que pretendia renunciar ao cargo. A presidente pediu-lhe então que continuasse de modo a assegurar a implementação das políticas do governo em prol da estabilidade neste momento de tensão com a China.

Taiwan president resigns as party head after election losses – DW – 11/26/2022Presidente da República de Taiwan, Tsai Ing-wen Foto: Sam Yeh (AFP)

Princípio de “One China” e o papel dos EUA

Desde sempre que a China nunca reconheceu Taiwan como um país independente, considerando-o sempre como território chinês, apesar dos esforços de Taiwan em contrário. Este tema sempre foi debatido, mais ou menos pacificamente, e aguardavam-se as eleições locais de 2022 em Taiwan, pois o seu resultado poderia determinar o rumo dos acontecimentos futuros. Uma vitória do DPP previa laços mais estreitos com os EUA em detrimento de Pequim, ao passo que a vitória do KMT foi mais favorável à China, que reivindica soberania sobre o território Taiwan e refuta toda e qualquer manifestação internacional pela independência do mesmo.

Foi já em outubro passado que o presidente da República Popular da China, Xi Jinping, abordou o tema dizendo que “nunca desistirá do uso da força” sobre Taiwan, ao mesmo tempo que apontava para uma reunificação “pacífica com a maior sinceridade e os melhores esforços”. Estas declarações surgiram depois da visita de responsáveis norte-americanos (5 membros do Congresso dirigidos pelo senador democrata Ed Markley) a Taiwan com o intuito de iniciar negociações para um acordo comercial entre Washington e Taipé.

A República Popular da China sempre levou muito a sério o seu Princípio de “Uma Só China”, ao mesmo tempo que sempre considerou Taiwan apenas uma província separatista, mas parte integrante da China. Assim, o acordo entre os EUA e Taiwan é visto como uma ameaça à paz e à estabilidade na ilha e pode levar ao corte de relações diplomáticas e comerciais entre Pequim e Washington, com a China a reagir e a prometer medidas firmes e exercícios militares a nível marítimo e aéreo em torno de Taiwan. Além do mais, devido aos acordos com Taiwan, também as desavenças entre EUA e China estarão em evolução, gerando alguma preocupação.

TAIWAN E A VINGANÇA DA GEOPOLÍTICAIlustração: Kyoko Nemoto (Nikkey Asian Review)

A Casa Branca já comunicou que continua a ser favorável ao princípio de “uma só China” e que não apoia a independência de Taiwan, algo que não foi muito convincente para os chineses, que pretendem penalizar quem “ataca” a nação.

A conquista de Taiwan pela China tem dois propósitos distintos: por um lado, a demonstração de força e rejuvenescimento depois da derrota – e consequente humilhação – com o Japão em 1895; por outro lado, este território permite fortalecer relações, predominantemente comerciais, com o resto do mundo uma vez que permite o livre acesso da China ao Oceano Pacífico.

Neste momento, os taiwaneses vivem num clima de incerteza acerca do que será o futuro de Taiwan e das relações com a China, algo que Francisco Coutinho, especialista em direito internacional, considera “um perigo”, dado que a China “está a rearmar-se” e é, neste momento, uma potência militar. O mesmo refere ainda, em declarações à ‘Sic Notícias’ que esta situação de indefinição vivida neste momento se compara ao conflito entre a Rússia e a Ucrânia.

Assim sendo, uma “vitória” e afirmação de poder da RPC sobre Taiwan significaria uma desvalorização do poder democrático (através da afirmação do autoritarismo comunista que vigora na China) e culminaria na perda de influência dos EUA no Pacífico.

Por conseguinte, a eleição de Chiang Wan-na e o regresso do Koumintang ao poder, é motivo de esperança do povo da República da China, prevendo-se um futuro com maior tranquilidade, estabilidade e evolução nas negociações com a China, evitando assim o conflito e o reacender das tensões.

Dois meses após as eleições, como está a situação de Taiwan?

A República Popular da China, como era expectável e tinha sido comunicado na pessoa do presidente Xi Jinping, não desistiu da unificação de Taiwan. Em contrapartida, também o território, que se considera independente, não recuou e a tensão ainda persiste.

Foi sob este clima de ameaças que Taiwan intensificou a sua atividade militar. Entres a medidas adotadas por Taipé para reforçar a sua defesa estão a intensificação do treino para reservistas e a aquisição de caças e mísseis antinavio. Além disso, a presidente Tsai Ing-wen já revelou que irá alargar, a partir de 2024, o serviço militar obrigatório de quatro meses para um ano. Estas medidas surgem num momento de aumento de preocupação em Taiwan no que diz respeito à segurança, motivado pela invasão russa à Ucrânia.

O ano de 2023 iniciou com declarações de David Deptula numa conferência do Centro Internacional de Estudos Estratégicos (CSIS – “Centre for Strategic and International Studies”), na qual sugeriu um apoio militar dos Estados Unidos a Taiwan.

“Os Estados Unidos devem armar a ilha com suficientes mísseis capazes de destruir a cidade de Xangai, caso a China decida invadir (…) têm de ser tornar “criativos” no que toca à criação de medidas de dissuasão, que evitem uma invasão chinesa a Taiwan (…) O objetivo é introduzir incerteza na mente dos nossos adversários”, afirmou David Deptula

A conferência do CSIS, juntamente com as visitas de vários líderes europeus a Taiwan – deputados alemães e lituanos, assim como outros deputados da União Europeia, Nancy Pelosi (membro da Câmara dos Representantes dos EUA), entre outros – provocaram uma resposta imediata por parte da República Popular da China que ameaçou, novamente, a integridade territorial de Taiwan.

O porta-voz chinês do gabinete de Assuntos de Taiwan, Ma Xiaoguang, disse em conferência de imprensa que “o apoio maldoso à independência de Taiwan entre elementos anti-China em alguns países estrangeiros é uma provocação deliberada” e o presidente Xi Jinping afirmou, em tom de ameaça, que “os políticos que interagem com o governo de Taipé estão a brincar com o fogo“.

Caça de combate e mísseis na base aérea taiwanesa de Makung na ilha de Penghu, em TaiwanCaça de combate e mísseis na base aérea taiwanesa de Makung na ilha de Penghu, em Taiwan. Fonte: REUTERS/Yimou Lee

Taiwan tem respondido às ameaças e investidas chinesas através da compra de mais armamento defensivo aos EUA, que se mostraram sempre prontos a colaborar militarmente, e do estabelecimento de acordos oficiais com outros países, aproveitando as suas indústrias de alta tecnologia e sistema democrático. Além do mais, Taiwan prevê duplicar a sua capacidade anual de produção de mísseis.

Em caso de Guerra, quem ganha e quem perde?

A recente invasão da Rússia à Ucrânia gerou ainda mais preocupação e demonstrou que a invasão da China a Taiwan não pode ser abordado – quer a nível interno, quer a nível mundial – como algo pouco provável, mas tem de ser levada a sério, dada a forte possibilidade de acontecer.

Mas afinal, supondo que a guerra se efetivava, quem sairia vencedor da mesma? A resposta é previsível: numa guerra não existem vencedores, todos perdem.

O relatório do CSIS, o “The First Battle of the Next War”, aponta para uma derrota estratégica da China, caso leve adiante a invasão de Taiwan, deixando um enorme rasto de destruição e milhares de mortos. Contudo, o lado dos defensores não é muito mais favorável, com os exércitos dos Estados Unidos da América e do Japão a ficarem num estado degradante depois de perderem uma parte significativa da sua marinha, como os porta-aviões, importantíssimos para a defesa das nações em questão. Os analistas acreditam mesmo que o resultado do conflito acabaria por diminuir o estatuto mundial dos EUA.