O ranking das escolas de 2021 foi publicado e dos primeiros 50 lugares, 47 são ocupados por colégios privados. As restantes 3 posições sobraram para as escolas públicas. As reações não tardaram a chegar e há quem atribua nota positiva e quem reprove a elaboração desta lista.
Já não é surpresa que os estabelecimentos de ensino privado conquistem os primeiros lugares do ranking. Afinal, este cenário repete-se nos vinte anos de existência da lista. No entanto, o ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, em declarações à RTP, confessa não ser “grande adepto de rankings” e classifica-os de “bastante redutores”.
No programa Fórum TSF, o ministro começa por explicar que os rankings não são da autoria do ministério da Educação, clarificando que o ministério, de forma transparente, “fornece um conjunto de dados à comunidade académica e também aos meios de comunicação, que acabam por fazer os rankings”. “Muito provavelmente porque sentem a necessidade de seriar, com um conjunto de critérios, as instituições de ensino. O ministério da Educação nunca sentiu vontade de o fazer”, explica Tiago Brandão Rodrigues.
Para o ministro, “estas listas seriadas, única e simplesmente centradas nos resultados dos exames nacionais, por exemplo, acabam por esconder muitas das qualidades, muito do trabalho das escolas, que são tão difíceis de medir num ranking dessa natureza”. Contudo, Tiago Brandão Rodrigues considera que “é muito importante conhecermos os dados e sabermos o que é que eles nos dizem”.
À RTP, o ministro elogia o trabalho desempenhado por muitas escolas públicas, “que vai muito para além da seriação dos resultados médios dos exames nacionais”, garantindo que o ministério tem “evidenciado esse trabalho ao longo dos últimos anos com um conjunto de novos indicadores”. Alguns desses parâmetros avaliados são, por exemplo, os percursos diretos de sucesso, que revelam “como as escolas agarram em alunos que tradicionalmente têm piores resultados e conseguem, depois de um ciclo, obter melhores resultados”, ou os indicadores de equidade, “que nos mostra[m] como as escolas trabalham com alunos de meios socioeconómicos mais desfavorecidos”. Estes dados podem ser acedidos no portal InfoEscolas.
O ministro relembra ainda que muitas das escolas que ocupam os primeiros lugares do ranking das médias dos exames nacionais têm a possibilidade de escolher os seus alunos, o que viabiliza “de certa forma, enviesar os resultados” dos estudantes nestas provas. Um fenómeno não muito presente nas escolas públicas, que recebem “todos os alunos do seu entorno, independentemente da sua condição de partida”.
O ministro da Educação ainda menciona ser uma “pena se estes rankings forem utilizados única e simplesmente por uma questão de marketing das instituições de ensino”. Contudo, quando questionado, no Fórum TSF, se os encarregados de educação olham para os rankings na altura de escolher a escola dos filhos, Tiago Brandão Rodrigues acredita que isso acontece “cada vez menos”.
Já em declarações à TSF, o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP) também critica a elaboração do ranking, referindo que “não fazem sentido” e que não avaliam “minimamente o trabalho das escolas”. Filinto Lima defende a necessidade de repensar o ensino secundário, por considerar que este é muito “redutor” e orientado “para o marranço, para exame, para o acesso ao Ensino Superior”.
Por sua vez, a Federação Nacional dos Professores (FENPROF), que se opõe à criação da lista desde a altura da sua criação, qualifica-a de “farsa” e refere que esta divulga informação “redutora, parcelar e distorcida” à opinião pública. Em comunicado, a FENPROF acusa “esta propaganda” de agradar aos colégios privados e de dificultar as escolas públicas, “em particular das que, encontrando-se em zonas de maior complexidade social, são rotuladas de piores”. A Federação acrescenta que esta classificação “não constitui um estímulo para essas escolas, antes as torna alvo de discriminação, desmoralizando alunos, professores e pais”.
O Secretariado Nacional da FENPROF afere que este ano o ranking das escolas adquiriu um carácter “ainda mais perverso”, devido aos meses de ensino à distância. A Federação recorda que este novo regime de ensino aumentou as desigualdades entre alunos, uma vez que muito deles não reuniam as condições “para acompanharem as aulas remotas, por falta de equipamentos, de acesso à Internet ou de apoio adequado para superar dificuldades”. “Convirá acrescentar que esses são os alunos que não frequentam os colégios privados”, conclui.
Da Confederação Nacional das Associações de Pais (CONFAP), Jorge Ascenção, em declarações à Agência Lusa, afirma que os rankings devem ser considerados “com ponderação” e relativizados. O presidente defende que “a comparação ajuda-nos sempre a melhorar e a evoluir, se olharmos para ela desta perspetiva”, mas admite que os portugueses analisam esta lista do ponto de vista “da escola melhor e da escola pior”.
Outra voz que se fez soar foi a de David Justino. O antigo ministro da Educação desaconselha “leituras simplistas” do ranking. Em entrevista à rádio Renascença e ao jornal Público, o social-democrata mostra-se a favor da divulgação dos rankings, pelo direito que as pessoas têm de poder aceder à informação. No entanto, David Justino frisa que “aquilo que vão fazer com a informação a que têm acesso é uma coisa completamente diferente”.
Outra opinião a favor da publicação destas listas é a do diretor executivo da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo (AEEP). Rodrigo Queiroz e Melo considera que os rankings são “muito positivos”, por avaliarem a “dimensão cognitiva do trabalho que está a ser feito nas escolas”. À TSF, o diretor constata a existência de escolas “que estão a trabalhar com públicos com muita maior dificuldade e que estão a ter muito melhores resultados do que escolas comparáveis”. Queiroz e Melo acredita que se não fossem os rankings, “ninguém fazia ideia” desta realidade.
Críticas não são de agora
Os rankings das escolas em Portugal começaram a ser elaborados em 2001, no mesmo ano em que o País de Gales anunciou que ia deixar de os publicar. Não foi preciso muito tempo para as críticas à realização desta lista começarem a surgir.
Em 2004, o Centro de Investigação das Políticas do Ensino Superior (CIPES), da Fundação das Universidades Portuguesas editou o estudo “Um Olhar sobre os Rankings”. A investigação conclui que estas classificações não tinham em conta um conjunto de elementos basilares para a interpretação da relação aluno-escola no processo de aprendizagem, como “a origem sociocultural dos alunos; a dimensão da escola, a composição do corpo docente, o grau de estabilidade do corpo docente e, por fim, a relação entre situação escolar de partida dos alunos, os objetivos de aprendizagem das escolas e os resultados conseguidos”. O estudo chega a classificar esta listagem de “calamidade pública”.
Um ano mais tarde, em 2005, os investigadores do estudo realizado pelo Programa AVES (Avaliação de Escolas com Ensino Secundário) da Fundação Manuel Leão, disseram que os rankings constituíam uma “imagem mais liofilizada e ignorante que se pode ter sobre o que é uma escola”.