Em altura de pandemia, os pedidos de ajuda ao Banco Alimentar do Porto aumentaram 600%. É o que diz o Jornal Observador, que também explica a mudança no perfil das pessoas auxiliadas pela instituição: só em 2020, somou mais de cinco mil pedidos de ajuda em situações de carência por causa do desemprego, em comparação às apenas 71 pessoas que pediram ajuda em 2019.
Em entrevista à APA, Inês Cardoso, psicóloga e responsável pelo Serviço Social do Banco Alimentar do Porto, explica mais detalhadamente a mudança na situação das pessoas que procuram a instituição:
“Em época de pandemia, temos um perfil diferente de pessoas. Neste momento, temos famílias com filhos em que só um trabalhava ou que os dois trabalhavam e que deixaram de trabalhar por causa da pandemia, ou que tinham contratos de trabalhos precários… Temos muitas pessoas da área da restauração, estética, turismo ou limpeza, ou pessoas das artes de circo, esculturas, pinturas, ou imigrantes que não conseguiram emprego. Veem-se numa situação que nunca pensaram viver… Portanto, deixaram de ter aquele rendimento e pedem ajuda ao Banco Alimentar.”
Inês Cardoso salienta ainda que são situações dramáticas para as famílias e muitos sentem vergonha em pedir ajuda, acrescentando que nem todos estão desempregados, mas um corte no rendimento já destabiliza a qualidade de vida destas pessoas:
“Muitos estão em layoff ou não estão a receber a totalidade dos rendimentos. Isso também porque muitas famílias, mesmo aquelas que estão em layoff, têm salários baixos e basta haver um corte que a família sente logo nos rendimentos. E assegurar o pagamento de uma renda… Da água, da luz, do passe ou da farmácia é mais difícil.”
“A pandemia veio trazer tempo… Tempo para pensar, tempo para refletir. Com as pessoas em casa, todos têm mais tempo útil e querem dar sentido ao seu tempo – e uma das formas que as pessoas encontraram foi através do voluntariado.”
O trabalho do Banco Alimentar também foi dificultado pela diminuição de voluntários no início do período pandémico. É o que relata António da Silva, voluntário e presidente do Banco Alimentar do Porto. Os grupos de risco, como idosos e pessoas com doenças crónicas, ficam impedidos de contribuir e mesmo os jovens precisam de se resguardar:
“Em relação aos mais novos temos que ter também cuidado. Primeiro porque não podemos estar a infetar pessoas que nos dedicam o seu tempo. E depois o Banco Alimentar do Porto não pode fechar. Há 60 mil pessoas que todos os dias esperam que saiam produtos para eles. São dez a quinze toneladas de alimentos movimentados por dia aos mais carenciados.”
O Banco Alimentar do Porto também apoia pessoas que estão institucionalizadas, em lares de idosos, creches, vítimas de violência doméstica ou mães com filhos que se encontram em abrigos. Ou seja, dedicam o apoio a 300 instituições parceiras em 18 concelhos do distrito do Porto, todas com diferentes problemas, que pedem respostas sociais distintas:
“Entre essas 60 mil pessoas, apoiamos diversas respostas sociais. Não queremos só tentar ajudar a resolver um problema social, queremos acompanhar os vários problemas sociais que existem e que são responsabilidade de todos”, afirma Inês Cardoso.
“Essa é a nossa missão. Lutar contra o desperdício e buscar onde sobra para dar onde falta.”
A situação mais aguda foi relatada por António da Silva, quando os motoristas que levam os cabazes de alimentos ficaram infetados e o próprio Banco Alimentar teve de entregar os alimentos nas instituições:
“Há muitas instituições que têm os funcionários com Covid-19 ou em confinamento. Informaram-nos que o motorista estava infetado, portanto o Banco Alimentar precisa fazer das tripas coração para ir até as instituições entregar os alimentos.”
Apesar dessas dificuldades, Inês Cardoso diz que, a longo prazo, a pandemia trouxe mais voluntários. De acordo com a psicóloga, é possível que isso tenha acontecido porque o confinamento disponibilizou mais tempo para boas ações:
“Cada vez mais as pessoas estão preocupadas em doar o seu tempo em prol do outro. A pandemia veio trazer tempo… Tempo para pensar, tempo para refletir. Com as pessoas em casa, todos têm mais tempo útil e querem dar sentido ao seu tempo – e uma das formas que as pessoas encontraram foi através do voluntariado.”
O presidente do Banco Alimentar explica que as campanhas de arrecadação junto aos supermercados acontecem duas vezes por ano, embora tenham ocorrido diferentes campanhas ao longo de 2020 noutros locais, com restrições e adequando-se às medidas da pandemia. Há uma movimentação de cerca de 3.500 voluntários em todas as grandes superfícies e também na busca de outros produtos diretamente com as empresas. Ao todo, são 21 bancos alimentares em Portugal.
Para chegar ao Banco Alimentar, as pessoas contactam através de email ou mesmo mensagem nas redes sociais, como explica Inês Cardoso:
“As pessoas chegam de várias maneiras ao Banco Alimentar – contactam o Banco Alimentar diretamente ou mandam email, mensagem ao Facebook ou Instagram. Pedem ajuda, nós ligamos e fazemos uma primeira avaliação da necessidade ou carência da pessoa, perguntamos alguns dados pessoais e também fazemos um breve descritivo da situação do agregado familiar em termos de despesas e receitas. Isto vai-nos permitir avaliar a carência imediata, avaliamos se a pessoa tem alimento em casa, se não tem, se há dinheiro para comprar… Se for uma situação que precise de intervenção urgente, encaminhamos para uma instituição apoiada por nós mais próxima da área de residência daquela pessoa.”
Posteriormente, as famílias são avaliadas a partir de documentos comprovativos e passam a receber mensalmente os bens alimentares. Inês Cardoso e António da Silva mostram-se gratos por todos os colaboradores do Banco Alimentar, acrescentando que as ajudas com voluntários, donativos ou alimentos são essenciais para o funcionamento da instituição:
“Essa é a nossa missão. Lutar contra o desperdício e buscar onde sobra para dar onde falta. É a realização deste sonho que nos permite alimentar esta ideia de combate ao desperdício para dar aos mais carenciados da nossa sociedade”, reitera António da Silva, salientando que as pessoas que os ajudam são “extraordinárias”.
Se quiseres ajudar ou voluntariar-te no Banco Alimentar, basta contactar diretamente a organização mais próxima da tua localidade ou preencher o formulário do site.