Artigo escrito por Amanda Ribeiro e Ricardo Silva

Com as eleições marcadas para 24 de janeiro, o Tribunal Constitucional (TC) admitiu, em dezembro, os sete candidatos à Presidência da República. Em 2016, quando o TC admitiu dez candidatos às eleições presidenciais, foi um número recorde. Sete, no entanto, não fica por menos – antes, seis candidaturas tinham sido o número máximo, apresentadas nas eleições de 1980, 2006 e 2011.

O processo até à formalização das candidaturas

Anteriormente, os boletins de voto e notícias dos meios de comunicação anunciavam o militar Eduardo Baptista como um dos possíveis candidatos. Inclusivamente correu a sorteio no TC, para o estabelecimento da ordem das nomenclaturas no boletim de voto – na época, somavam-se então oito candidatos. O motivo da diminuição do número de candidatos foi, entretanto, a rejeição da candidatura do militar, devido a várias irregularidades encontradas – apenas seis das assinaturas apresentadas eram consideradas válidas.

Depois de feitas as manifestações de vontade, as candidaturas só ficam válidas após o Tribunal Constitucional as aceitar formalmente. É necessário um mínimo de 7.500 e máximo de 15.000 assinaturas de cidadãos eleitores – apresentadas e validadas – 30 dias antes das eleições convocadas pelo Presidente da República – atualmente, cargo ocupado por Marcelo Rebelo de Sousa. No caso das eleições deste ano, as assinaturas tiveram de ser apresentadas até ao Natal. 

Por ordem alfabética, os candidatos na corrida ao Palácio de Belém são: Ana Gomes, André Ventura, João Ferreira, Marcelo Rebelo de Sousa, Marisa Matias, Tiago Mayan e Vitorino Silva. Dois são repetentes – Marisa Matias e Vitorino Silva – e, tal como cinco anos atrás, duas são mulheres. 

Conheça os candidatos

Ordem estabelecida pelo sorteio para os boletins de voto 

Marisa Matias

Marisa Isabel dos Santos Matias anunciou a sua candidatura a 9 de setembro do ano passado. Tem 44 anos, é investigadora e socióloga formada pela Universidade de Coimbra e doutora em Sociologia com a tese “A natureza farta de nós? Saúde, ambiente e formas emergentes de cidadania”. É vice-presidente do Grupo da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Nórdica Verde desde 2009 e está no seu terceiro mandato como eurodeputada pelo BE no Parlamento Europeu (desde 2009). Foi eleita após encabeçar a lista do Bloco de Esquerda à Câmara Municipal de Coimbra, no ano de 2005, e reeleita em 2014 e 2019. É dirigente do seu partido (do qual faz parte desde 2004) e integra a Mesa Nacional e a Comissão Política. 

É segunda vez que se candidata à presidência e conta com o apoio do partido – o Bloco de Esquerda. Na primeira vez que foi candidata às Presidenciais, ficou em terceiro lugar, com 10,12% dos votos – o melhor resultado que uma mulher já obteve no país nas eleições presidenciais.

Já no escrutínio deste ano, o resultado não promete ser tão animador. Pelo menos, de acordo com as sondagens. Segundo a mais recente, divulgada no dia 14 de janeiro e realizada pela Pitagórica para a TVI/Observador, Marisa Matias pode-se ficar pelos 4% nestas eleições, o que representaria uma perda de mais de metade dos eleitores que a ajudaram a chegar ao resultado de 2016. 

A candidata bloquista diz querer “um regime que responda à pandemia social” e que resolva os problemas sociais graves e as precariedades do país. Pretende melhorar o sistema de saúde público, posiciona-se ao lado dos jovens trabalhadores e mostra vontade em ir ao encontro das medidas de combate às alterações climáticas e às desigualdades sociais. Sobre este último tópico, afirma: “o meu modelo de combate às desigualdades prevê acabar com o sistema de privilégios”. 

No debate com Marcelo Rebelo de Sousa, tratou de diferenciá-los, dizendo que o atual presidente “exerceu a sua influência a favor dos privados” e que ela, entretanto, quer a “proteção dos serviços públicos”. Em resposta, Marcelo Rebelo de Sousa garantiu que é “suficientemente velho para ter votado a Constituição” e defendia o SNS, tratando de minimizar as diferenças. 

Marcelo Rebelo de Sousa

Marcelo é o favorito a ganhar a corrida a Belém, mantendo a tradição portuguesa de reeleger o Presidente. Fotografia: Público

Marcelo Nuno Duarte Rebelo de Sousa tem 72 anos e é professor universitário, jurista, jornalista e comentador político de rádio e televisão. É licenciado em Direito pela Universidade de Lisboa desde 1971, doutorando-se em Ciências Jurídico-Políticas no ano de 1984. 

É o atual Presidente da República, eleito em 2016, e foi líder do PSD de 1996 a 1999, partido ao qual aderiu após o 25 de Abril de 1974. Nas eleições de 2016, recebeu 52% dos votos dos portugueses, que, pelo que as sondagens indicam, não ficaram desiludidos com o trabalho de Marcelo. Segundo a sondagem da Pitagórica, o Presidente vai reforçar a sua posição em mais 10 pontos percentuais nestas eleições – um resultado incontestável que parece obliterar qualquer esperança numa segunda volta. 

O anúncio da sua recandidatura só veio a 7 de dezembro de 2020 e é apoiada tanto pelo seu próprio partido – que aprovou no final de setembro uma moção de apoio ao candidato –, como pelo CDS-PP. 

No seu percurso político, Marcelo Rebelo de Sousa foi candidato à presidência da Câmara de Lisboa em 1989, Ministro dos Assuntos Parlamentares entre 1983 e 1984, Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares entre 1981 e 1982, presidiu às Assembleias Municipais de Cascais e Celorico de Basto e foi Deputado à Assembleia Constituinte pelo PSD. 

Criticado pelo seu constante apoio ao Governo, Marcelo afirma que é necessário evitar crises políticas e que esta legislatura deve durar até ao fim. A sua principal missão, se for eleito, vai ser combater a pandemia e as suas consequências na vida dos portugueses, enquanto assegura o bom funcionamento das instituições democráticas, que, segundo o também candidato, devem acolher tudo e todos. 

Numa audiência recorde de um debate político na televisão – com quase dois milhões de telespectadores -, o debate com o André Ventura enfureceu Marcelo. Em temas como a prisão perpétua, as divergências tornaram-se bem nítidas: Marcelo afirmou-se da “direita social”, enquanto Ventura respondeu que na sua direita não cabem “bandidos” e que quer ser o “Presidente dos portugueses de bem”. Marcelo Rebelo de Sousa denotou ainda que “pena de morte e pena de prisão perpétua” são inaceitáveis, lembrando que, “Sá Carneiro e João Paulo II não a aceitaram” – “ídolos” assumidos pelo líder do Chega. 

Tiago Mayan Gonçalves

Tiago Pedro de Sousa Mayan Gonçalves é advogado, tem 43 anos e é licenciado em Direito pela Universidade Católica Portuguesa do Porto. É também um dos fundadores do partido Iniciativa Liberal e preside ao seu Conselho de Jurisdição. A 25 de julho, declarou que seria candidato nas eleições presidenciais de 2021. 

No lançamento da sua candidatura, afirmou: “sou um cidadão como vocês, farto da bolha em que o sistema político vive, alheado da vida dos portugueses. Sou descomprometido. Não estou envolvido em teias de interesses, de cumplicidades e de conveniências, dos séquitos e das elites do Terreiro do Paço”. Contudo, os portugueses não parecem muito convencidos com as suas palavras. É que, segundo a sondagem da Pitagórica para a TVI/Observador, o candidato apoiado pela IL pode estar a disputar o último lugar – apenas 2,3% das intenções de voto se concentram no liberal, deixando-o duas décimas à frente de Vitorino Silva. 

Tiago Mayan foi militante do PSD e envolveu-se em campanhas do “Porto, o Nosso Partido”, que posteriormente elegeram Rui Moreira para a Câmara da Cidade. Ele também é membro suplente da Assembleia de Freguesia da União de Aldoar, Foz do Douro e Nevogilde. 

É contra o controlo por parte do Governo do aparelho do Estado, economia e média – um “genuíno liberal”, como se autointitula. Para Tiago Mayan, Portugal tem ficado para trás em relação a outros países europeus por causa das políticas socialistas que têm vindo a ser adotadas. Desta forma, é preciso que a regulamentação do mercado venha de independentes e não das mãos do Governo, permitir a liberdade de escolha na Educação e Saúde – que, segundo o candidato, tem-se centrado apenas no setor público -, aproximar o poder político dos cidadãos e apostar na meritocracia. 

No debate com João Ferreira, comunista e liberal discordaram veementemente, mas mantiveram-se amenos. Tiago Mayan chegou a ser duro, e, quando o tema foi a recuperação da economia em momento de crise, afirmou que “as propostas de João Ferreira são uma receita para o desastre”, pois o candidato “quer nacionalizar tudo”. “Quer tudo nas mãos do Estado.”

Já em clima de consenso, em relação ao Estado de Emergência, a ideia de que “a liberdade individual está a ser colocada em causa desnecessariamente” uniu-os.

André Ventura

André Claro Amaral Ventura tem 37 anos e preside o partido Chega, constituído em abril de 2019 – neste mesmo ano, em outubro, tornou-se deputado, quando o seu partido participou pela primeira vez nas eleições legislativas. É também autor de diversos livros sobre direito e desporto, professor universitário e ex-comentador de televisão nos temas de política e desporto.

Foi anteriormente militante do PSD e candidato à Câmara Municipal de Loures em 2017. Um ano depois, rompeu ligações com o partido e abdicou do seu cargo de vereador, depois de afirmações polémicas sobre a comunidade cigana. Na altura, explicou que saiu do partido por discordar em temas ideológicos.

Com toda a notoriedade que a criação do Chega e as suas constantes declarações polémicas lhe deram, o deputado único encontra-se agora a disputar o segundo lugar destas eleições. Afirma que a sua principal oponente é Ana Gomes e, com 11% das intenções de voto, segundo a última sondagem da Pitagórica, parece estar-se a sair melhor nesta batalha, embora a diferença seja demasiado residual para dar certezas. 

André Ventura foi o primeiro dos candidatos a pré-anunciar a sua intenção de concorrer ao cargo de Presidente da República, a 29 de fevereiro de 2020. Entre as medidas que é a favor, estão “uma base político-ideológica assente num liberalismo económico e político de natureza personalista”, “o regresso da prisão perpétua para homicidas e violadores”, “castração química para pedófilos e a imediata introdução do crime de enriquecimento ilícito”, como tratou de deixar claro nos debates com o Marcelo Rebelo de Sousa.

Vitorino Silva

Vitorino Francisco da Rocha e Silva  – apelidado de Tino de Rans – tem 49 anos e frequência no curso de comunicação no ISLA – Vila Nova de Gaia. Foi calceteiro e presidente da Junta de Freguesia de Rans – terra na qual nasceu, no concelho de Penafiel – entre os anos de 1994 e 2002, tendo sido eleito nas listas do PS. 

Vitorino Silva ficou famoso pelo seu discurso no XI Congresso do Partido Socialista, em 1999. Os militantes receberam tão bem as suas palavras que até riram e tudo terminou com um abraço ao secretário-geral da época, António Guterres. 

Nas autárquicas de 2009, concorreu à Câmara Municipal de Valongo e, em 2017, à Câmara Municipal de Penafiel. Em 2016, quando foi candidato a Presidente da República pela primeira vez, conseguiu 3,28% dos votos – um resultado que não parece ter forças para manter, segundo as últimas sondagens. De acordo com a Pitagórica, Vitorino Silva concentra apenas 2,1% das intenções de voto, o que lhe daria o último lugar. 

Em 2019, fundou o partido RIR – Reagir, Incluir, Reciclar. Na segunda candidatura à presidência, afirmou: “a minha candidatura é muito forte, feita de gente simples onde a qualidade impera”. O local do anúncio escolhido foi a Feira do Livro do Porto, nos jardins do Palácio de Cristal – e foi aí que Tino de Rans, como é conhecido, fez a primeira comparação entre a sociedade portuguesa e o seu último livro, “A…corda pr’á vida”. 

Fala da história de alguém que foi “deixado para trás” e é isso que marca a candidatura do ex-socialista – defender os portugueses que têm sido, sistematicamente, menosprezados pelo sistema político. Afirma ser a favor de uma maior redistribuição de recursos entre a população, mas não sem uma maior fiscalização. 

No debate com André Ventura, aconteceram discordâncias e entendimentos. Vitorino Silva não concorda com o presidente do Chega quando o assunto é cortar apoios aos cidadãos de etnia cigana que vivem de rendimentos, embora concorde que existem pessoas que os recebem sem merecer. Também acusou os outros candidatos de só se preocuparem com as elites, afirmando que representa o povo.

João Ferreira

Com apoio do Partido Comunista, João Ferreira quer usar a sua candidatura para defender os direitos dos trabalhadores. Fotografia: PCP

João Manuel Peixoto Ferreira tem 42 anos, é biólogo, vereador da Câmara Municipal de Lisboa, deputado do PCP no Parlamento Europeu e vice-presidente do Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica do Parlamento Europeu. A sua formação académica passou pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, em 2000, doutorando-se posteriormente, em 2003. 

A sua história política data de 1997, quando foi membro da Assembleia de Freguesia da Ameixoeira até 2005. Foi promovido no XXI Congresso Nacional do PCP à comissão política do Comité Central comunista, encabeçou a lista pela CDU nas Europeias de 2014 e 2019 e nas autárquicas de Lisboa em 2013 e 2017. 

A candidatura, anunciada pelo PCP, ocorreu a 12 de setembro, tendo também o apoio do Partido Ecologista Os Verdes. Defende os direitos da classe trabalhadora, “mantendo a integridade daqueles que fazem a economia continuar a progredir”, a luta pelos jovens, pelo povo, e defendendo que “é altura de remunerar melhor todos aqueles que vivem do seu trabalho, empenho e esforço”. 

As palavras podem ter ecoado numa boa parte do eleitorado do PCP, mas o seu escopo de influência parece ficar-se por aí. De acordo com a última sondagem publicada, João Ferreira encontra-se em quinto lugar na corrida a Belém, com 3,2% – não muito longe de Marisa, mas também perto de Mayan e Vitorino. 

No seu debate com o liberal, João Ferreira denotou as suas posições económicas e políticas: “nós não podemos pagar os desmandos de outros e depois entregar o banco a quem quer que seja. Se o Estado paga, o Estado tem que ser dono”. Demonstrou ainda desagrado com a “repetição de receitas liberais e de austeridade”, defendendo que “seria desastroso”.

Ana Gomes

Ana Maria Rosa Martins Gomes tem 66 anos e é licenciada em Direito pela Universidade de Lisboa desde 1979. Em 1980, entrou na carreira diplomática, tendo sido consultora do presidente Ramalho Eanes, entre 1982 e 1986. Relativamente ao histórico profissional, fez parte da Missão Permanente de Portugal junto das Nações Unidas, onde coordenou a Delegação Portuguesa ao Conselho de Segurança. Também trabalhou nas embaixadas portuguesas em Londres e Tóquio e foi deputada do Parlamento Europeu. Teve também destaque na posição de chefe da missão diplomática portuguesa na Indonésia, durante o processo de independência de Timor-Leste.

A ex-eurodeputada anunciou que se iria candidatar a 17 de maio de 2020, caracterizando Marcelo Rebelo de Sousa como “inativo e passivo”. A militante do Partido Socialista garante que a sua candidatura é “apenas pelos portugueses e por mais ninguém”. Defende transparência e serviço completo ao interesse nacional.

Afirma ser uma candidata anticorrupção, contra as desigualdades sociais, lentidões na justiça portuguesa e a iniquidade fiscal, ao mesmo tempo que pretende defender os mais velhos e criar oportunidades para os jovens. O que a distingue dos candidatos à sua esquerda? Dá como exemplo as Forças Armadas e de segurança. Ana Gomes quer um reforço destas áreas, nunca descartando um escrutínio das mesmas, até para impedir infiltrações de extrema-direita no seu seio. 

Todas estas políticas valeram-lhe o apoio dos partidos PAN e Livre e protagonistas do cenário socialista, como Manuel Alegre, Francisco Assis, Pedro Nuno Santos e Duarte Cordeiro.

O segundo lugar nas presidenciais pode ser ainda uma realidade para Ana Gomes, embora tenha vindo a perder a vantagem que tinha sobre o candidato André Ventura. Com 10,8% das intenções de voto na sondagem da Pitagórica, o desejo de uma segunda volta, com que entrou para esta corrida, parece cada vez mais uma miragem. 

Em debate com Vitorino Silva, disse que apoia as medidas restritivas, mas critica o Estado de Emergência. Afirma: “não considero que se possa banalizar a cobertura legal, o arco legal, para essas mesmas medidas. Já houve mais do que tempo para que fosse feita uma lei de emergência sanitária”. Disse ainda que o governo tem de assegurar que o país aguenta “fechar” novamente. 

Revisto por Pedro Valente Lima.